1- Exposição Permanente “Teatro Wayang Kulit de Bali”

TEATRO DE SOMBRAS DE BALI

Introdução

O teatro de marionetas de sombras é uma tradição antiga na Indonésia, considerado pela UNESCO em 2003, Património Oral e Imaterial da Humanidade. Na ilha de Bali mantém um papel importante no calendário religioso e festivo das aldeias. As apresentações podem ser diurnas em que a finalidade ritual é preponderante, ou nocturnas, em que sobressai a função de espectáculo para a aldeia ou comunidade. Estas iniciam-se ao final de noite e duram cerca de quatro horas.
Na versão tradicional o teatro é composto por um conjunto de marionetas cinzeladas em pele bovina; um ecrã (pano), pendurado entre duas varas de bambu, e uma base de tronco de bananeira que serve para espetar os cabos das figuras. Por trás do ecrã, ao centro, está uma lâmpada a óleo, atrás da qual se senta o dalang (marionetista), que tem a seu lado a caixa das marionetas. Atrás, uma orquestra com quatro instrumentos de percussão (metalofones) que produzem ritmos e melodias e marcam a entrada das cenas e personagens. O marionetista levanta as marionetas segurando o punho do cabo que as suporta e manipula os braços das figuras através de duas hastes; conforme a sua mestria consegue mexer em várias marionetas ao mesmo tempo. O público observa o movimento das sombras e dos seus recortes, projectados no ecrã e ouve as vozes que o dalang reproduz. As várias personagens entram em cena, de acordo com a história representada.

O Teatro | Marionetas e Fontes Literárias

As marionetas são reflexos dos deuses e de personagens mitológicas inspiradas no repertório narrativo da religião hindu e pré-hindu. Os deuses ganham vida para manter a ordem e o equilíbrio que estão sob constante ameaça pela simples passagem do “tempo”, kala. Este é personificado em vários demónios e simboliza uma força, benéfica ou maléfica conforme a realização das oferendas rituais.
Duas das principais fontes literárias são os textos hindus Mahabharata e Ramayana. No primeiro os temas mais populares derivam da famosa rivalidade entre os cinco irmãos Pandawa e os seus primos Korawa pela posse do reino de Hastina. Este conflito dá origem a inúmeros enredos. A epopeia Ramayana relata episódios do herói Rama, como o rapto da sua mulher Sita pelo demónio Rawana. Para recuperá-la Rama e o seu fiel soldado macaco Anoman, aliam-se ao exército de macacos do rei Sugriwa.
Estas e outras personagens transmitem valores e comportamentos, legitimados pelo carácter ritual do espectáculo. O jogo de luz e de sombras, bem como presenciar o ganhar vida das marionetas que se transformam em poderosos deuses, reis e guerreiros tem continuado a exercer fascínio sobre os públicos ao longo de séculos. O wayang kulit mantém-se como prática performativa de entretenimento e comemoração ritual, especialmente em contexto rural. Ganhou também popularidade enquanto atracção turística.

 

HISTÓRIAS

Wayang parwa

Bima. MNE: AV.493. Krobokan, Bali, Indonésia. 24 x 66,5 cm. Imagem de António Rento. Representa um dos cinco príncipes Pandawa, filho do Rei Pandu e de Kunti, no repertório Mahabharata. A sua figura é facilmente reconhecida pela marca de nascimento, uma garra pontiaguda em cada mão, elemento comum com o seu pai Bayu e com Anoman.O reino de Hastina tinha três príncipes herdeiros, Dastarasta, Pandu e Widura. O primeiro era cego e por isso impossibilitado de se tornar o rei. Pandu, pai dos cinco irmãos Pandawa é coroado e casa-se com duas mulheres, Kunti (mãe de Yudistira, Arjuna e Bima) e Madrim (mãe de Nakula e Sahadewa). Além deste parentesco real, os cinco heróis Pandawa possuem também descendência divina, sendo o pai espiritual de Yudistira o deus Dharma; de Bima o deus Bayu, de Arjuna o deus Indra e Nakula e Sahadewa dos deuses gémeos Aswins.
Dastarasta casa-se com Gandari, confirmando a sua virilidade através do nascimento de Duryodana e outros 100 filhos, os Korawa. Existe ainda um meio irmão dos Pandawa, Karna, filho ilegítimo de Kunti, fruto da relação com Surya e que se tornará aliado dos Korawa. Durante a guerra os Pandawa descobrem a verdadeira identidade de Karna e após a sua morte por Arjuna, em batalha, reconhecem-no como irmão.
A morte de Pandu resulta de um acidente quando este caçava num bosque e avistou um casal de veados. Disparou uma seta que acertou na fêmea e nesse momento os animais revelaram-se como sendo um sábio eremita e a sua esposa. A partir desse dia o rei foi amaldiçoado com a morte caso tivesse relações sexuais com uma mulher. Vários anos depois, o rei é seduzido pela beleza de Madrim e morre ao ceder à tentação.
Após a morte de Pandu, a decisão de excluir Dastarasta do trono é reconsiderada e este torna-se rei, assistido por Widura e por Bisma. Os Pandawa e os Korawa crescem em conjunto e são educados pelos melhores professores, Bisma, Krépa e Drona. A rivalidade entre os primos cresce à medida que os cinco irmãos se tornam populares no reino e surgem rumores que Yudistira, sendo filho do rei Pandu, deverá suceder a Dastarasta. Duryodana e o seu calculista aliado Sakuni conspiram formas de afastar os cinco Pandawa. Os conflitos e intrigas sucedem-se até que a grande guerra Bharatayuddha é declarada. Os vários episódios que relatam as mortes de guerreiros dos dois lados revelam a ambiguidade de carácter tanto dos Pandawa, como dos Korawa. Eventualmente, os Pandawa são considerados merecedores da vitória e Yudistira conquista o trono de Hastina.

Drona_AV466D_CustomBima Suci

Drona, professor do jovem impestuoso Bima, pede que este entre na floresta e traga água sagrada e purificada, tirtha kamandala, necessária para rituais funerários. Com o objectivo que Bima fosse morto por ogres ao perder-se na floresta, Drona dá-lhe indicações erradas sobre o local onde encontrar a água.
Tal como Drona prevê, Bima encontra um raksasa (ogre) e durante a luta o jovem decapita-o utilizando a sua garra aguçada (característica deste herói Pandawa). A alma do ogre ascende ao céu sob a forma do deus Indra, que pede perdão pelo ataque. Bima recusa, afirmando que os deuses não pedem perdão aos mortais. Em seguida regressa ao palácio e entrega a cabeça degolada a Drona, que assustado com o feito de Bima confessa que a água sagrada está guardada no meio do oceano.
Ao aproximar-se do oceano, Bima é cercado e atacado por cobras que o tentam devorar. Este defende-se mais uma vez, decepando os animais. Ao entrar na água, Bima afoga-se. Nesse instante o céu escurece mostrando lamento pela morte do príncipe. Sanghyang Tunggal, considerado em Bali como o deus omnipotente e admirador do jovem Bima e da sua honestidade, compadece-se com a morte e ressuscita-o. Diz-lhe que poderá encontrar água purificada se entrar dentro do corpo do próprio Sanghyang Tunggal e para espanto do jovem transforma-se numa réplica do próprio Bima. Durante o diálogo com o deus supremo, Bima pergunta-lhe as seguintes questões: qual o sentido da morte, qual o sentido dos sonhos e qual é a coisa mais pura no mundo. Sanghyang Tunggal responde que o homem morre ao atingir o ponto na sua vida em que os deuses deixam o seu corpo. Quando o homem sonha, é a alma que deixa o corpo e vagueia. Por último Sanghyang Tunggal diz a Bima que nada no mundo é perfeito e exceptuando Semara, deus do amor, todos os deuses são ainda impuros. As próprias flores das oferendas rituais não são totalmente puras.
Bima entra dentro do corpo de Sanghyang Tunggal onde se situa o paraíso. Encontra um santuário contendo um pequeno cofre com água sagrada. Regressa a casa levando o cofre e a sua família alegra-se ao vê-lo vivo, enquanto Drona irritado rejeita o cofre duvidando que a água fosse sagrada. Nesse instante Sanghyang Tunggal fala através do corpo de Bima e amaldiçoa Drona com uma terrível doença. O professor de Bima pede perdão ao jovem e Bima desculpa-o afirmando que como velho mestre, Drona não deve humilhar-se.

AV467DAdiparwa, o nascimento dos Pandawa.

Na corte do rei Drupada realiza-se um torneio para escolher um pretendente adequado para casamento com Drupadi, a filha do rei. Os cinco irmãos Pandawa encontravam-se em exílio na floresta, mas decidem participar no concurso, disfarçados. Arjuna, o mais habilidoso guerreiro dos cinco irmãos conquista a mão da princesa. No entanto, para grande consternação de Drupada, Arjuna afirma que irá partilhar a esposa com os restantes irmãos. O sábio Byasa toma a palavra e explica ao rei que este casamento partilhado foi ordenado pelos deuses e conta a história que explica o nascimento dos cinco heróis e de Drupadi.
Numa era passada, a Terra é igual ao Paraíso, não existe diferença entre os deuses e os homens, estes vivem em paz e não há doenças. O deus Yama encontra-se na floresta Naimisa, a realizar um sacrifício. Indra, entre outros deuses, não compreende porquê esta igualdade e questiona Brahma sobre a razão dos homens não sentirem sofrimento. Brahma responde que quando Yama concluir o seu ritual os homens irão envelhecer e morrer. Esta resposta agrada aos restantes deuses.
Indra passeia pela margem do rio Ganges e repara em flores de lótus de cor dourada flutuando e segue-as pelo rio. Encontra uma rapariga a chorar, cujas lágrimas criavam as flores. Indra pergunta-lhe com quem ela é casada e porquê a razão da sua tristeza. A jovem afirma que é a Sri, a deusa do arroz, mulher de Wisnu. Ela conta a Indra que no topo de uma montanha viu um casal a namorar e sentiu inveja. Pede-lhe ainda que os atinja com a sua arma em forma de raio. Indra aceita e os dois encaminham-se para a montanha.
O casal é o deus Siwa e a sua mulher Uma, que assumiram formas humanas. No momento em que Indra ataca, Siwa paralisa-o e funde-o com a própria montanha, dividindo-o depois em cinco partes, que irradiam luz. Como lição e castigo Siwa ordena que cada uma das cinco partes de luz encarne num dos irmãos Pandawa e que estes cinco homens se casem com a encarnação de Sri na terra, Drupadi. Após o castigo, Indra pede a Wisnu que o acompanhe de forma a ter um amigo na terra. Wisnu encarna então como Kresna e Brahma como Baladéwa, dois irmãos da família Yadu, que acompanham a vida dos cinco irmãos Pandawa. Além desta origem divina, os cinco irmãos são também descendentes de deuses, já que os seus progenitores são Dharma, Bayu, Indra e Aswins.
Após ouvir a história contada pelo sábio Byasa, o rei Drupada orgulha-se da futura união da sua filha com os heróis Pandawa.

AV496DYudistira ascende ao paraíso

Yudistira decide alcançar o paraíso e inicia uma viagem espiritual, seguido pelos seus quatro irmãos Pandawa (Arjuna, Bima, Nakula e Sahadewa) e por Drupadi. Durante o percurso, todos excepto Yudistira revelam fraquezas de carácter devido a comportamentos na vida terrena. Por essa razão sucumbem e morrem. Permanece apenas um cão que segue o Pandawa mais velho, até à entrada do paraíso, quando surge um elefante branco que transporta Indra. Nesse momento oportuno, chegam também os panasar (criados) Merdah e Tuàlen. Os três conversam com Yudistira e elogiam a sua conduta moral; Indra convida-o a entrar no paraíso, enquanto Merdah tenta sem sucesso, que ele e o seu pai sejam incluídos no convite. O Pandawa concorda com a entrada desde que o seu fiel cão o acompanhe, condição negada pelo deus. Nesse momento o animal transforma-se no deus Dharma que acompanha o príncipe na visita ao paraíso. Aqui Yudistira apercebe-se da presença dos seus 100 rivais e primos Korawa sem no entanto conseguir encontrar os irmãos e Drupadi. O príncipe diz a Indra que os cinco Pandawa prometeram que permaneceriam juntos nos bons e maus momentos e que ele não podia agora quebrar essa promessa, para ficar na companhia dos inimigos Korawa. Decide então, juntamente com os dois panasar, descer ao submundo e procurar os restantes Pandawa. Ao chegar ao inferno, Yudistira apercebe-se do sofrimento das almas, inclusive da sua família, mas mantém firme a sua decisão. Nesse momento há uma inversão dos dois espaços, paraíso e inferno, e os Korawa trocam de lugar com os Pandawa. Merdah e Tuàlen regressam à terra.

AV454DCalon Arang

Rangda é uma viúva com reputação de bruxa, cuja filha não consegue casar, uma vez que todos os pretendentes receiam a sua mãe. Rangda em fúria jura vingar-se de todos no reino de Daha, do rei Airlangga. Rangda e as suas maléficas pupilas (Rarung e Léak) dançam no cemitério e veneram a deusa Durga, pedindo que esta as ajude a destruir o reino. A deusa aparece e dança com as bruxas, concede o desejo de destruição a Rangda, advertindo-a para não atingir o centro do reino. As bruxas percorrem o território lançando epidemias e causando a morte da população.
O rei Airlangga ordena aos seus soldados que matem a bruxa, ordem que estes cumprem surpreendendo Rangda e apunhalando-a no coração enquanto dormia. Rangda acorda sem qualquer ferimento e consome os soldados nas suas próprias labaredas. A bruxa vai mais uma vez para o cemitério com as suas pupilas e dança em honra de Durga, que surge de novo. Ao dançar com as bruxas avisa Rangda para ter cuidado.
O rei, desesperado, pede ajuda ao mestre Mpu Bharada que indica a Bahula, o seu jovem assistente, que se case com a filha de Rangda. Após o casamento, Bahula descobre o segredo do poder de Rangda num pequeno livro preto mágico, que ele rouba e entrega ao seu mestre. O livro é um manual de ética que ao ser lido de trás para a frente anula os actos das bruxas. Bharada mata Rangda com um dos seus próprios mantras, mas ao verificar que esta morreu na sua forma monstruosoa, decide reanimá-la, dando-lhe aparência humana, o que lhe permitirá ser absolvida dos seus crimes.